Netos. Como é bom ter netos!…

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Afinal, o que são e para que servem os netos?

Dizem que netos constituem o reflexo de nós mesmos e que nada mais são do que o espelho do nosso passado distante. Olhamos os netos e enxergamos a nossa infância, a nossa ingenuidade diante da vida que só estava começando.

É bom ter netos, mesmo porque não temos a obrigação de educá-los, tarefa atribuída aos pais. E aí podemos amá-los na plenitude do amor verdadeiro. Sabia que cuidar de netos é uma excelente terapia, que ajuda a evitar a demência senil? Pois é. Um estudo recente apresentado por Jonathan LaPook, especialista em Alzheimer e demência, sugere que cuidar dos netos é uma atividade que poderá prevenir a deterioração cognitiva e o aparecimento de Alzheimer e demência. A atenção constante, o cuidado e o carinho estimulam e obrigam os nossos processos mentais a reativarem-se e a trabalharem convenientemente.

Meu neto Lucas, na plenitude de seus quatro anos de idade, era um garoto muito esperto. Magricelinho, mas de boa saúde. Puxou a família do pai, onde os nossos parentes são umas varas de apanhar mamão.

Era proseador que nem ele só. Conversinha estralada, para chamar a atenção. Fazia já alguns dias que ele acompanhava seus pais, de férias, lá em casa.

Um dia, vinha eu chegando um pouco apressado, devido aos afazeres da lida diária, e flagrei-o comendo um pedaço de doce de leite. O naco era grande e ele não havia chegado à metade ainda. Mais do que depressa, como era costume entre nós, pus-me a reivindicar os meus direitos a uma fatia daquela deliciosa merenda.

– Lucas, me dá um pedaço desse…

Não pude completar a frase. No que comecei a falar e a pedir, ele enfiou o pedação de doce todinho na boca. Para a mercadoria caber no recipiente, foi necessário que ele se socorresse da ajuda das duas mãos, virando-me as costas, para se esconder melhor. Não aguentei. Ri a gargalhadas.

– Que coisa feia, Lucas, ridicando um pedacinho de doce do vovô!…

Ele, meio que apurado, quis rir também, mas começou a tossir. E tossiu e vomitou o doce todo – que na mesma velocidade que entrou, saiu –, enchendo as mãos de doce e de baba. Uma baba comprida, parecendo catarro. Aí riu de verdade, oferecendo-me uma ponta da comida vomitada.

– Aqui, ó vô, um pedacinho pro cê.

– Eco, não quero esse trem nojento não!

– Não, vô, pega. Tamo, é seu. Tá com nojo de mim?

E ria mais ainda, porque tinha a certeza de que eu não ia pegar aquela nojeira. Não ia comer aquele doce já começado a dissolver com sua saliva. Ele sabia disso e fez de propósito, justamente para ver minha reação.

Depois disso, Lucas ficou com a consciência pesada, me adulando, puxando conversa… E eu me esquivando, pra me valorizar.

– Vô, vou buscar outro pro cê, tá!

– Cê vai ter que pedir a vovó, que você não sabe onde ela guarda os doces?

– Eu que não sei, vô? Eu sei, mas não falo.

– Onde, me conta?

– Não posso. Ela falou preu não comer doce que senão dá lombriga e estraga os dentes.

– Então, você pegou escondido?

– Foi, mas não conta pra ela não, viu, vô!

– Tá bom, eu não conto pra ela, mas me diz onde é que tá o doce!

– É lá no armário da cozinha, “drento” do pote de “vrido”.

Enfim eu e o Lucas nos reatamos e pudemos esvaziar o pote de “vrido” de “drento” do armário, que deveria estar cheio de doce de leite em pedaços – pedaços saborosos –, caso Lucas não o tivesse encontrado há alguns dias.

Elson Oliveira
Elson Gonçalves de Oliveira foi professor de Língua Portuguesa, é advogado militante e escritor, com vários livros publicados.
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