Conhecer o tempo das coisas. Entender quando é o momento certo. Saber a hora de recuar ou fazer e acontecer, calculadamente. Quem domina essa virtude, tem nas mãos o Santo Graal da política. A precipitação leva ao princípio. A ansiedade mata antes quem não a controla.
Em várias ocasiões, vi Iris Rezende, prefeito de Goiânia aos 86 anos, jogar água na fogueira de assessores afobados. Eu mesmo tive um impacto na chegada à sua equipe, quando convidado para a Secretaria de Comunicação.
Estava honrado, sem dúvida. Porém acima de tudo estava preocupado em fazer a coisa certa diante de um mito, uma cidade, um desafio profissional novo. Ele não me atendeu com pressa, nem com a sala cheia de gente. Estávamos sozinhos quando ele me disse sorrindo que estava contente com a minha disposição e presença ali. Assim, humilde, voz baixa, cuidadoso.
Lembro que ele me olhava com atenção. Senti carinho, acolhida. Quis me mostrar precavido. “O senhor sabe que vou precisar de uns dois meses para me inteirar de tudo, né?”, eu finalmente falei. Ele abriu o sorriso com vontade, chegou mais perto e disse apenas: “Você vai levar mais tempo até compreender como a prefeitura funciona. Não tenha pressa.”
Eu vinha de um convite feito com visível contrariedade para um cargo que precisava de respaldo absoluto, o que nunca tivera. Aquele abraço com palavras carregadas de sabedoria e respeito vieram no momento certo e da melhor forma possível. Eu não tive dúvida de que estava no lugar certo, na hora certa, com o líder certo. Nos meses seguintes, posso dizer com paz no coração que nunca fui tão feliz profissionalmente.
Quando a COVID estourou, todos queríamos que Iris ficasse em casa, que estivesse com o mínimo possível de pessoas. Suas filhas, Ana Paula e Adriana, fizeram de tudo para preservá-lo dos perigos da doença, para reduzir o ritmo de trabalho. E ele? Nem deu bola para ninguém. A explicação? Era nessas horas que a cidade precisava ter a certeza de que quem estava na cadeira que ele ocupava não iria abandoná-los, que seria o líder (ele não usou essa palavra para falar de si, naturalmente) que todos esperavam.
Em nenhum dia Iris deixou de ir à prefeitura. Em nenhum instante se omitiu ou se ausentou de tomar as decisões necessárias, mais difíceis que fossem. Jamais abriu mão do bônus e do ônus de estar na posição que estava naquele momento triste, e também histórico. E calculava cada ato segundo o instante exato a ser deflagrado. Era impossível demover Iris de ser Iris o tempo todo da pandemia.
Tomei o exemplo de Iris porque ele ocupa desde sempre uma posição de exemplo como homem público. E também porque tive o privilégio e a bênção – como ele, tenho fé nos desígnios divinos – de viver ao seu lado, mesmo depois dele deixar a prefeitura, os anos finais de sua vida. Mais que argumento, o que sou aqui é testemunho de vivência.
Os tempos hoje são de velocidade máxima. Rápidos no gatilho, assessores e políticos correm contra o tempo para que cada respiração política esteja instantaneamente nas redes sociais. Jornalistas não apuram mais como antes, políticos não amadurecem decisões ou escolhas como deveriam. É a vida literalmente contra o tempo, e não a favor do tempo. É a política exercida no intervalo da respiração.
Mas o essencial não mudou. Administrar o tempo é a chave do sucesso, a essência da revolução individual contra não o tempo, mas a aceleração dos outros. Respeitar os segundos não é perder tempo, é ganhar uma eleição, muitas vezes. Saltar etapas na política não será nunca adiantar-se aos demais. Bico calado e pé ligeiro é arte, compasso, medida. Por que seria desespero desabalado?
Mas não acreditem em mim. Mirem-se em Iris. Sua sabedoria é imortal, e seu coração, infinito em todas as direções.
*Texto publicado pela Tribuna do Planalto