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Políticos e assessores vivem com nervos à flor da pele; eu assino embaixo

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Fazer comentário sobre o comportamento de um político sempre foi risco de morte para quem se arvora. Se o elogio é evidente, há comemoração do lado do elogiado. Mas basta uma crítica pegar de raspão para que o mundo caia e o indigitado, que ousou falar o que falou, vira o escrutínio justo e injusto da parte dos incomodados. Políticos e assessores vão de zero ao infinito sem parada para abastecer de oxigênio quando mencionados em áudio, vídeo ou texto, um segundo, uma linha que seja, mas não seja como creem merecer.

Faz parte do jogo o cuidado, ainda que extremado, com a imagem e reputação do político. É o ativo que ele tem, o sinal de futuro. Exageros e política rimam com propriedade. Uma vez acordei de uma noite puxada de fechamento no O Popular com a sentença de demissão estampada na testa. Um fogo crescente me consumia antes mesmo que eu pudesse ver a luz do sol. Levei um tempo para entender o que estava acontecendo. Enquanto isso, o governo, a outra parte envolvida, chama a imprensa pra coletiva para desmentir o jornal. Caos.

Primeiro, o que me era relatado pelo meu chefe não batia com o que fora feito pela equipe de política – repórter, editores, fechadores – na noite anterior, com tudo feito e checado como manda o código de ética da profissão. Então, por que a balbúrdia? Quando peguei o fio da meada, corri para o Palácio e meio que tive uma pequena discussão com um assessor durante a coletiva em que ele, e não o governador, era o centro. A discussão era simples: mas o que mesmo estava errado na informação do jornal? Onde residia o ponto da discórdia?

Nenhuma resposta convincente, só ânimos exaltados de lá e de cá. E me exalto, assumo, na defesa do que penso ou informo. Já melhorei muito tentando corrigir isso, mas é da minha natureza. O que consegui no alto dos meus mais de 50 anos foi o saldo: eu me controlo, mas nem tento, e infelizmente nem sempre. Como o outro lado sentia-se cheio de razão, o pau comeu. O que salvou a situação, e o meu emprego na editoria de Política, na época, foi um personagem fundamental em tudo que o assunto envolvia. Aliás, o principal protagonista, eu diria. Ainda no ambiente da coletiva, já se dissipando, vejo andando em minha direção o presidente da Assembleia, palco do que virou confusão.

Cito o nome do presidente, por uma questão de respeito que sempre tive a ele e por entender que era alguém próprio ao ambiente democrático, que se debate, mas sem perder a correção intelectual e o respeito mútuo. Sebastião Tejota me ouviu, e confesso que fui ríspido por conta da tensão do momento, ouviu o que o assessor do governador argumentava e foi rápido no gatilho: o que relatamos estava correto. Foi exatamente o que aconteceu em uma votação que entrou pela madrugada. Um alívio, pra mim. Gravei, mandei para o meu chefe e fui pra casa. Nem tive ânimo para tripudiar, se quisesse.

Assessor mais realista que o rei é mato. Político menos ponderado que seus conselheiros é fogo na ribanceira. E como é natural que a imprensa erre bastante – e falo de erro mesmo, coisa de humanos, e não de ações mal intencionas, espelho de caráter -, política é também pandemônio. Campo minado para o bom senso e a visão do mundo segundo o que o mundo é, e não o que se deseja, o que se falseia ou o que se imagina. Porque nesse universo nada se cria, tudo se copia e se ajusta para cumprir um objetivo que releva a justeza e a justiça dos meios.

Escrevo e falo sobre política há mais de 30 anos. E agora com a liberdade de ser em uma coluna, com crônica e análise e poesia, e não em reportagens. Já fiz campanhas, assessorei políticos e comandei redações das mais diversas. Quando alguém se incomoda com algo que digo, se incomoda mesmo – copiando aí o bordão daquele influencer de Goianésia -, e até exagera na dose ou porque entendeu mal de verdade, ou porque assim atende a uma sua conveniência imediata. Cansei de tentar corrigir interpretações errôneas do que falei ou escrevi, porque vira um rastro de onça sem fim. O esforço para arrumar as coisas costuma inclusive dar efeito inverso, piorando tudo.

Um inferno, sempre disse a mim mesmo e aos amigos com quem desabafo. Mas bobagem. Nunca vou agradar a todos – velha verdade humana -, muito menos a mim mesmo, que faço algo com uma intenção e o resultado é outro. Duro ter que repetir nessas horas: de bem intencionados o reino do diabo está cheio. Fato. Então passei a me ocupar de me esforçar para não sofrer com as repercussões do que faço. Melhor. Não resolve, mas alivia o peito por carregar mais uma verdade ancestral: mal sei de mim, que dirá dos outros. Sofro calado, deixo muitas vezes ilações e distorções a meu respeito correrem soltas. No melhor estilo foda-se.

Não tenho manual de pensamento nem comportamento, nem bula ensinando como usar, e jamais terei a pretensão de andar por aí com placas de direção. Quem sou eu? Minha angústia eu levo com a graça que a idade tem me dado. Para alguns é rabugice; para outros, armadura inútil. Fico repetindo para mim: tudo isso tá muito engraçado – mesmo quando estou desgraçadamente na merda das bocas de uso privado. Tudo bem. Sirvo para esterco, ora. E de fato me esforço para me divertir. Escrevo e falo, pois, com a licença de quem não leva o mundo e a política a sério e muito menos a mim mesmo. Tudo passa, Nossa Senhora d’Abadia que me proteja.

A virada nessa minha visão das coisas aconteceu, acredito, ali pela virada do século. Cansado de tudo, absolutamente convicto de que meu destino era ser Quixote, resolvi procurar ajuda profissional no mercado – porque, à psicologia, sempre recorri, graças a Deus. Fui atrás de uma empresa, que se chama Empreza com Z, onde tenho uma amiga de grande consideração de minha parte, por tão boa convivência em outros tempos, vejam, psicológicos. Eu disse: Helena, tô muito insatisfeito, quero mudar de profissão, se for o caso. Ela me direcionou a uma sócia. Foi uma bateria de conversa e preenchimento de papéis. Uma jornada, pra mim.

No fim das contas, o que ouvi de boca aberta e me segurando para não rir nem me desesperar. Eu estava na atividade certa, claramente gostava do que fazia, o problema, que se definia na insatisfação, era simples e um só: eu precisava apenas – apenas, anotem isso – arrumar um jeito de ganhar dinheiro. Quer dizer: meu problema era trabalhar, apanhar, brincar, aturar e não ganhar com isso o suficiente; outra: meu problema era que minha matéria orgânica e espiritual era erguida daquelas próprias substâncias que me angustiavam, e eu só não me realizava porque não havia compensação financeira que me permitisse ser mais do que eu era.

Eu resumi tudo em três palavras: não tenho cura. Estou fadado a viver como Sisifo, porque é viver para me alegrar, mas também para sofrer as consequências. Como não abro mão de lidar com minhas escolhas, de fazê-las apesar de saber que muitas vezes elas se voltarão contra mim, eu só tenho uma saída: rir de tudo, de todos, principalmente de mim mesmo. O que escrevo e falo não é para assessor nem para político – embora sempre enxerguem segunda intenções e recados nas entrelinhas, além do que há de fato -, é para quem lê e, no melhor dos mundos, para eu mesmo, mim mesmo, o caralho que for.

Ser ranzinza está para mim em igual medida a ser feliz. Porque tudo me compõe, me expõe, me denuncia. E daí que achem que escrevo porque fulano está mandando, ou que este filado, ao menor sinal de contrariedade, considere que eu mudei de lado, ou que no final das contas eu acabe ficando desempregado e sem dinheiro para sobreviver e para viver como eu gostaria. Já estou como água de morro abaixo e fogo de morro acima: ninguém me segura. Não tem jeito. E antes que digam que vou morrer assim, alto lá, eu dou seis no seu truco. Vou viver assim. Nunca foi fácil, por que logo agora que o espírito está mais livre vou começar a achar que a vida ficou difícil? Difícil é me aturar. Não me justifico, nem me explico. Eu assino embaixo.

*Texto publicado pelo Diário de Goiás

Vassil Oliveira
Jornalista. Escritor. Consultor político e de comunicação. Foi diretor de Redação na Tribuna do Planalto, editor de política em O Popular, apresentador e comentarista na Rádio Sagres 730 e presidente da agência Brasil Central (ABC), do governo de Goiás. Comandou a Comunicação Pública de Goiânia (GO) e de Campo Grande (MS).
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